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Carlos Martins: “PT terá de calibrar seu discurso para atender anseios”

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A volta do ex-presidente Lula ao debate político efetivo, com sua libertação após decisão do Supremo Tribunal Federal, levanta uma série de questionamentos. É inegável que a presença do petista em palanques pode ajudar a reaglutinar as forças progressistas, que indicavam certa desordem depois do último processo eleitoral que levou a extrema-direita ao poder em boa parte do país.

 

No entanto, o ideário propalado pelo Partido dos Trabalhadores na figura de seu líder histórico ainda é capaz de convencer a parcela da população mais afetada pelas medidas de desmonte do Estado, em especial das políticas públicas de emprego e renda, promovidas pelo governo de Jair Bolsonaro?

 

O professor de Ciências Políticas do Instituto de Relações Internacionais e Defesa (Irid) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Carlos Eduardo Martins coloca este como um dos desafios das legendas de esquerda em um momento de polarização do embate e já observa uma mudança no diálogo partidário.

 

“O PT vai ter de calibrar, reencontrar um discurso para atender às angústias e anseios da população brasileira, e não só o PT, mas a frente de esquerda e centro-esquerda. Aqui no Rio de Janeiro, o Lula já ratificou seu apoio à candidatura do Marcelo Freixo (PSOL) [à prefeitura], o que mostra que são forças políticas que estão se articulando de maneira distinta do que se articularam durante o protagonista do petismo através dos governos Lula e Dilma, quando a crítica que se fazia a esses governos pela esquerda era profundamente desconsiderada. Estamos no momento em que o hegemonismo do PT se reduziu bastante e ele tem de dialogar com outras forças políticas e sociais”, analisou.

 

O diagnóstico da opinião pública em relação ao debacle das administrações progressistas no Executivo federal passa pelas diferenças estabelecidas entre as gestões de Lula e Dilma. O docente da UFRJ fez questão de destacar os principais fatores de distinção destes períodos.

 

“O governo Lula articulou o crescimento com a expansão dos gastos públicos, enquanto o governo Dilma tentou articular o crescimento à desoneração fiscal e teve maus resultados em relação a isso. Além do mais, o governo Dilma também, pressionado pelo empresariado, por banqueiros em relação às manifestações de 2013, determinou a elevação brutal da taxa de juros para desmontar a organização desses setores, gerando milhões de desempregados”, pontuou.

 

“O governo Dilma chegou a pagar, em 2015, 9,5% do PIB (Produto Interno Bruto) de juros, revertendo a trajetória inicial que havia estabelecido de reduzir a taxa de juros. Saltou de 7,5% para 14,5%. Tudo isso criou politicamente um cenário muito confuso onde parte da população brasileira continua atribuindo a crise aos governos petistas”, prosseguiu Martins.

 

A sua vocação ao desenvolvimentismo e a boa imagem que ainda carrega de parte da população que obteve ascensão social durante suas gestões podem, na opinião do cientista político, oferecer ao ex-presidente dividendos eleitorais, ainda que Lula não possa concorrer ao pleito por sua condenação em segunda instância.

 

“O Lula me parece que é um personagem que encarna a ala mais desenvolvimentista do PT, muito mais que a Dilma expressou, e uma liderança política que tem um peso e o carisma que a Dilma não tinha. Ela acabou sendo mais muito mais suscetível à pressão do que o Lula é. O Lula também sabe que a margem de manobra que tem se reduziu muito e que não tem outra opção para se manter como uma liderança política crível a não ser assumir um processo popular com envergadura suficiente para fazer diferença em relação ao que está aí”, avaliou.

 

“Esse cenário político e esse percurso da trajetória política do Lula nos permitem ser otimistas quanto à construção de um bloco histórico que possa fazer diferença para o país nesse momento. Se o Lula vai ser ultrapassado pela radicalização desse bloco histórico é algo que a História terá de colocar”, vaticinou o docente.

 

GOLPE NA BOLÍVIA

A renúncia de Evo Morales à Presidência da Bolívia no último domingo (10) também foi alvo da análise de Carlos Eduardo Martins. Ele citou que o Brasil está envolvido na trama internacional que levou o país vizinho a um quadro de crise institucional praticamente indissolúvel e destacou o motivo da disputa de poder na região.

 

“Na Bolívia há um golpe de estado articulado pelo imperialismo com a participação também do governo Bolsonaro e das igrejas evangélicas brasileiras, como os áudios que foram flagrados demonstram. Evidentemente que o que está em cena é a desnacionalização do gás boliviano e dos derivados de hidrocarbonetos, mas, por outro lado, o golpe de estado também ganhou força com uma queda de prestígio da popularidade do Evo Morales”, disse.

 

A diminuição do apoio do povo ao presidente de origem indígena se deu, de acordo com o professor, pela insistência de Evo em manter sua candidatura à terceira reeleição, contrariando um referendo realizado na Bolívia em 2016, mas não foi este o único ponto de conflito.

 

“Outro fator de desgaste é uma política econômica que acabou criando insegurança jurídica para as reservas indígenas. É o caso, por exemplo, da reserva Tipnis. O Evo tentou criar uma estrada que passava por essa reserva ecológica em 2011. Diante dos protestos sociais, ele recuou e agora, em 2017, se retirou a segurança jurídica dessa reserva que a colocava fora desse tipo de projeto. O Evo acabou articulando uma política econômica na Bolívia que não rompeu com o modelo de reprimarização da política boliviana e, nesse sentido, vulnerabilizou recursos ecológicos. Isso levou a entrar em contradição com uma base indígena”, destacou Martins.

 

Ouça a entrevista de Carlos Eduardo Martins:

 

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