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Debate: As mulheres e seu dia

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Um emprego digno e com remuneração justa, o respeito aos corpos e à individualidade e o direito à representação institucional no Estado são situações comuns a uma sociedade organizada. Não para as mulheres. Às vésperas de mais um 8 de março, a luta por igualdade e contra a violência se reafirma em um país onde uma mulher morre a cada sete horas pela sua simples condição feminina.

 

O Dia Internacional das Mulheres mobilizará manifestações ao redor do mundo no próximo domingo – no Rio de Janeiro, o principal ato se dará na segunda-feira (09) -, patrocinadas por movimentos feministas que congregam negras, indígenas, jovens, trabalhadoras domésticas e rurais, na articulação para que a realidade de gênero atual seja alterada.

 

Dani Monteiro

Dani Monteiro

Como em todos os anos, o Faixa Livre não ficou alheio ao debate sobre o tema e convidou a diretora de Administração e Finanças do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio (Sindjor-RJ) e integrante da executiva nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT) Virginia Berriel, a advogada criminalista e coordenadora adjunta do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais do Rio de Janeiro (IBCCRIM-RJ) Juliana Sanches, a articuladora nacional e coordenadora da Rede Jubileu Sul e vice-presidente do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS) Sandra Quintela e a deputada estadual pelo PSOL-RJ Dani Monteiro.

 

A luta feminina ao longo do tempo por igualdade no país não se restringe aos espaços sociais, ela avança ao ambiente político. Até meados do século passado, as mulheres sequer podiam votar. O direito foi concebido, com restrições, por um decreto do presidente Getúlio Vargas, em 1932, e garantido plenamente pela Constituição de 1934.

 

Os reflexos da ausência das mulheres na política se dão até hoje. Apenas 15% das cadeiras legislativas, aproximadamente, são ocupadas por parlamentares do sexo feminino no Brasil. Foi necessária a criação de uma legislação específica obrigando os partidos a financiarem candidaturas femininas.

 

“Temos uma democracia ainda muito jovem e que foi feita a partir de muita luta, muito suor e sangue dos trabalhadores do nosso país. Quando a gente pega o protagonismo, a presença das mulheres nessas lutas foi fundamental porque somos e sempre fomos linha de frente dos movimentos sociais. Eleger a presidente Dilma significava um avanço das mulheres que vinham dos movimentos sociais alcançando espaços que, para elas, sempre foram negados”, lembrou Dani.

 

Sandra Quintela

Sandra Quintela

“Venho de uma Casa Legislativa onde temos um time de futebol feminino, somos apenas 11 deputadas em um cenário de 70. É algo muito difícil. Se a gente considerar que 50% dos lares do Brasil são chefiados por mulheres, precisamos dizer que fazer política para as mulheres é fazer política para a família brasileira, para os territórios, é fortalecer a vida do trabalhador. Quando falamos de políticas públicas voltadas para o gênero, na verdade estamos falando de políticas públicas para todos e todas”, continuou.

 

Ainda que venham ocupando, aos poucos, espaços no mercado de trabalho formal, as mulheres ainda sofrem preconceito neste ambiente. Apenas 50% delas estão representadas na força de trabalho global, pouco em comparação aos 75% de homens.

 

No Brasil, a presença de mulheres em cargos de alta gestão chega a 19%, contra 27% no restante do mundo. A discrepância entre gêneros é evidente também quando se considera a remuneração ao trabalho. Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o salário feminino é 22% menor do que é pago para um homem. Enquanto isso, a lógica do cuidado doméstico sofreu poucas alterações.

 

“Pela divisão sexual do trabalho, pelo que foi definido historicamente, cabe às mulheres cuidar, simplesmente cuidar. Ninguém vê o que fazemos, nem a sociedade, nem os governos, parece uma coisa naturalizada. Mesmo que uma mulher esteja em um emprego formal e um homem desempregado formando um casal, ela vai fazer mais tarefas domésticas do que ele. É uma construção social cultural que precisamos enfrentar”, ressaltou Sandra.

 

As estruturas baseadas na acumulação de bens se utilizaram do caráter patriarcal das sociedades para relegarem às mulheres funções fundamentalmente ligadas às relações humanas, em condições financeiras precarizadas.

 

“O capitalismo se aproveitou de maneira brilhante do patriarcado para baixar os salários. Por exemplo, os setores de saúde e educação são compostos por mulheres. Agora, se você vai um pouco adiante e olha os cargos de direção, eles são compostos por homens. Nós, feministas, queremos mudar o mundo não só para as mulheres. A sociedade não é só mercado, é muito mais complexa. Do ponto de vista das economistas feministas, queremos revelar esse lado oculto da economia. O [filósofo István] Mészáros dizia que o feminismo é o calcanhar de Aquiles do capitalismo”, citou a vice-presidente do PACS.

Virginia Berriel

Virginia Berriel

 

O desrespeito às mulheres no país é potencializado pela gestão de Jair Bolsonaro, que tem por prática atacar profissionais de imprensa, como nos recentes casos da jornalista Patrícia Campos Mello, do jornal Folha de S. Paulo, ofendida com referências sexuais pelo mandatário, e de Vera Magalhães, do Estado de São Paulo, que noticiou o incentivo do político por mensagens eletrônicas às manifestações contra o Legislativo e o Judiciário.

 

“Quando há o contexto de um governo que reproduz esses discursos de ódio, inclusive contra as mulheres, de fato é como se ele legitimasse muitas atitudes que são reproduzidas no nosso cotidiano”, destacou Juliana.

 

Um relatório da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) do último ano mostra que os casos de ataques a profissionais de imprensa, fundamentalmente mulheres, cresceram cerca de 54%. Destes, sete em cada dez foram proferidos pelo ex-capitão do Exército.

 

“Iisso envergonha a todos nós jornalistas, mas deveria envergonhar o país inteiro. Se esses ataques foram cometidos de forma institucional, se o presidente pode atacar as mulheres jornalistas no exercício da sua profissão, qualquer pessoa poderá atacá-las”, disse Virginia.

 

O processo de impedimento de Dilma Rousseff, ocorrido em 2016, também foi caracterizado pela jornalista como um episódio de preconceito.

 

“Nós tivemos um golpe nesse país e não foi um golpe só contra a presidenta Dilma, foi evidentemente um golpe misógino por ela ser mulher. Vejam os precedentes que foram abertos desde um impeachment sem culpa nenhuma para vivermos essa barbárie toda”.

 

Juliana Sanches

Juliana Sanches

A retórica grosseira da institucionalidade federal é reproduzida nos números da violência no país. Em 2019, apesar de uma redução dos homicídios dolosos de mulheres em 14%, houve um aumento dos feminicídios, crimes de ódio motivados pela condição de gênero.

 

Foram 1.314 mulheres mortas pelo fato de serem mulheres, uma alta de 7,3% em relação aos 12 meses anteriores, conforme dados oficiais divulgados pelos estados brasileiros. É o segundo ano consecutivo em que o índice cresce.

 

O levantamento se contrapõe também ao número de assassinatos no Brasil, que tiveram redução de 19%, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Desde 9 de março de 2015, a legislação penal tipifica o crime de feminicídio, o que não fez com que as mortes de mulheres, provocadas especialmente por seus companheiros, diminuíssem. A advogada criminalista questionou as medidas tomadas para impedir essas ocorrências.

 

“Temos de refletir também se essa resposta para a violência contra a mulher deve sempre passar pela via penal. É preciso pensar quais são de fato as soluções efetivas para combater essa violência, se não precisamos pensar políticas públicas, ter uma educação sobre gênero nas escolas, falar da necessidade dos homens respeitarem as mulheres seja nos seus círculos familiares ou de trabalho. É importante desconstruir essa cultura machista e misógina em que vivemos”, considerou.

 

Ouça o debate na íntegra:

 

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