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Debate: o que esperar do segundo ano do governo Bolsonaro?

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A chegada de Jair Bolsonaro ao poder veio carregada de expectativas quanto à possibilidade do estabelecimento do fascismo no país, com a ameaça do retorno de uma ditadura civil-militar. Apesar das medidas autoritárias implementadas pelo ex-capitão do Exército em seu primeiro ano de mandato, algumas delas derrubadas pelo Legislativo e pelo Judiciário, o endurecimento do regime parece uma realidade ainda distante no Brasil.

 

Contudo, a coalizão de forças que ocupa o Palácio do Planalto trouxe, a reboque, iniciativas que atendem aos interesses neoliberais, liderados pelo ministro da Economia Paulo Guedes. As reformas da Previdência, já aprovada, e a Tributária, em tramitação no Congresso, se unem à precarização irrestrita das relações de trabalho e a níveis recordes de desocupação, conformando um quadro de desalento para a maioria da população.

 

Adhemar Mineiro

Adhemar Mineiro

É possível mudar este panorama em 2020? Para debater as perspectivas para o país, o programa Faixa Livre convidou o economista Adhemar Mineiro, o professor titular do Instituto de Estudos Estratégicos (Inest) da Universidade Federal Fluminense (UFF) Eurico Lima Figueiredo e o jornalista do Coletivo Intervozes e servidor concursado da Ancine Gustavo Gindre.

 

Anunciada com entusiasmo pela mídia dominante e principal plataforma de propaganda do Governo Federal, a suposta retomada da atividade econômica no Brasil, no ano passado, ficou restrita a setores que pouco influenciam a vida dos brasileiros. Os números da produção industrial, importante instrumento de análise de conjuntura, demonstraram o desânimo dos investidores.

 

Houve queda de 1,2% na comparação entre outubro e novembro de 2019. Em relação ao mesmo período do ano anterior, o recuo foi de 1,7%. De janeiro a novembro, o acumulado do índice da produção industrial aponta uma redução de 1,1%. Os dados, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicam um futuro pouco promissor.

 

“A expectativa para a economia, como todo ano, entra com uma amplitude bastante grande. Os mais otimistas estavam falando entre 2,5% e 3% de crescimento. Acho muito difícil. O que é mais provável, embora, por conta do cenário internacional qualquer previsão seja muito arriscada, no caso brasileiro, desconsiderando a possibilidade de uma ruptura vinda do exterior, as previsões é de que, ao longo do ano, vá se retrocedendo para um nível parecido ao que se teve nos últimos três anos, algo em torno de 1%”, citou Mineiro, utilizando-se da metáfora do voo da galinha para determinar o salto dos índices financeiros nacionais.

 

“Você continua, provavelmente, em um quadro de estagnação e isso não é uma coisa imprevista. É a consequência de uma política contracionista do ponto de vista fiscal, não dá elementos para a expansão, e no caso da indústria, ainda recebe os impactos regionais porque especialmente alguns setores, como o automobilístico, têm um mercado importante na Argentina, que passa por uma crise grave. Medidas protecionistas começam a ser tomadas e isso, evidentemente, vai atingir um dos principais exportadores, que é o próprio Brasil”, alertou.

 

Enquanto isso, na política, a aliança entre o Parlamento e o Executivo nos temas que favorecem a burguesia deu o tom nos 12 meses iniciais de Bolsonaro no cargo máximo da República.

 

O presidente da Câmara Rodrigo Maia, afora os embates ideológicos com o ex-militar e suas pretensões para as próximas eleições gerais, seguiu o alinhamento com o personagem chave da administração federal.

 

Eurico Lima Figueiredo

Eurico Lima Figueiredo

“Nunca foi uma lua de mel [a relação entre Maia e Bolsonaro], foi um flerte, namoro, virava noivado, casamento, divórcio, foi complicado sempre. O Brasil passou por uma certa esquizofrenia porque vimos o presidente Bolsonaro criando uma série de problemas continuadamente, já se disse que ele continuava em campanha, usando o mesmo expediente que teve todo o sucesso na mídia informal. Foram gafes, palavreados, frases, momentos desagradáveis para o comportamento de um mandatário da República”, rememorou Eurico.

 

“Rodrigo Maia se comportou o tempo todo de uma maneira alinhada não ao presidente, mas ao ministro da Economia e, portanto, aos interesses que viam na reforma da Previdência uma espécie de divisor de águas da história brasileira. Se, por um lado, temos um presidente que joga granadas no campo político, as pessoas ficam debatendo o que falou de maneira inapropriada, por outro, na Câmara, passa toda a pauta econômica. Bolsonaro, por assim dizer, mobiliza politicamente seus adversários que, em vez de entender o principal, respondem ao secundário”, diagnosticou.

 

Para ilustrar sua expectativa para o ano, Gindre destacou dois episódios recentes. Um deles foi a notícia de que o setor de telemarketing foi o que mais provocou o fechamento de postos de trabalho no ano passado – 22 mil.

 

“Significa que o Brasil começa a ser afetado por uma nova revolução industrial, atingindo diretamente o setor de serviços, especialmente os serviços de menor qualificação. Esse é o grande problema, o Brasil tem hoje mais ou menos o mesmo número de pessoas proporcionalmente empregadas no setor de serviços que os Estados Unidos. Em compensação, enquanto nos Estados Unidos está se empregando majoritariamente em setores de serviços ligados à indústria, que geram mais valor agregado, no Brasil, são setores ligados ao comércio, que geram menos valor agregado”, citou, elencando, na sequência, outro fator: a chegada do banco chinês XCMG ao Brasil.

 

“Ele não opera no setor financeiro, mas na venda de máquinas para construção, com um discurso de complementaridade do BNDES. Para mim, parece estar claro que a China vê no Brasil o papel de especialização produtiva. Ela vai trazer para cá indústria de construção civil basicamente e, por outro lado, cobra do país a exportação de commodities. Na falta de apoio para essas duas atividades, ela própria resolveu vir com seu capital para financiar isso. Esse momento tende a acelerar essa especialização produtiva, essa forma de inserção do Brasil no cenário internacional como mero exportador de commodities”, lamentou.

 

A condição precária do país e o horizonte de baixas expectativas se devem, na opinião de Mineiro, a um passivo crescente na história nacional. A falta de resolução para os dramas sociais nos torna vulneráveis aos interesses externos e aos avanços tecnológicos.

 

Gustavo Gindre

Gustavo Gindre

“O Brasil é um país que sempre se caracterizou por essas fugas para a frente, ele não resolve os problemas históricos e passa a se deparar com os novos problemas. O professor Eurico se referiu à questão da desigualdade, que é essencial, mas se vamos ao fundo desta questão, chegaremos à escravidão, que até hoje não foi resolvida, à propriedade da terra, que não é resolvida. Quando o Gustavo fala da perda de postos de trabalho na área de telemarketing, essas pessoas estão sendo substituídas pela inteligência artificial”, comentou.

 

A falta de compromisso da suposta burguesia nacional com um projeto de desenvolvimento do país provoca o naufrágio de candidaturas de centro-esquerda que flertam com os interesses do capital hegemônico, como é o caso de Ciro Gomes (PDT).

 

Para Gindre, os processos de ruptura política com o neoliberalismo sofrem com o descrédito em todo o mundo, criando um horizonte de perspectivas vagas para o povo.

 

“Há uma crise internacional na esquerda. Você busca referências hoje e elas são raríssimas. Isso impacta a esquerda brasileira em termos de elaboração, em termos, inclusive, de se acreditar que um projeto é possível. Veja a Grécia, por exemplo. Qualquer projeto que se pretenda insurgente e questionador, naufraga ou vai arriar as bandeiras e compactuar”, ressaltou.

 

Ouça o debate na íntegra:

 

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