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Debates especiais de fim de ano: Educação

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A formação de uma sociedade independente e capaz de minimizar as desigualdades se dá com o fomento ao ensino público de qualidade. Ciente do sucesso dessa lógica, o governo de Jair Bolsonaro estabeleceu a educação como um dos principais alvos de ataque em 2019 para implementar seu projeto de desmonte do Estado nacional.

 

Contingenciamento do repasse de verbas para as instituições federais, desvalorização do corpo docente, nomeação de ministros sem quaisquer capacidades técnicas e propagadores de teorias estapafúrdias, patrulha ideológica com o esforço para a aprovação no Legislativo do ‘Escola sem partido’ foram algumas das iniciativas da nova administração do Palácio do Planalto.

 

Gustavo Miranda

Gustavo Miranda

O recrudescimento, no entanto, provocou uma forte reação dos profissionais de educação, que se mobilizaram durante todo ano Brasil afora e foram responsáveis pelo maior movimento organizado contra o governo, nos protestos em 15 de maio.

 

Para debater o estágio do ensino no país e tentar traçar os rumos para 2020, o programa Faixa Livre convidou a professora da Universidade Federal Fluminense (UFF) e diretora do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes) Eblin Farage, o presidente do Sindicato dos Professores do Município do Rio de Janeiro (Sinpro-Rio) Oswaldo Teles, o coordenador-geral do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro (Sepe) Gustavo Miranda e o professor do Departamento de Português do Colégio Pedro II do Centro Tiago Cavalcante.

 

A avaliação do ano que vai se encerrando na educação apresenta um quadro dúbio: surpresa com o aprofundamento ainda maior de uma expectativa de caos criada antes da posse do ex-capitão do Exército e a disposição dos profissionais de ensino para combater a tentativa de imposição de uma lógica financista para o setor.

 

“Sofremos inicialmente um baque que foi meio que uma anestesia. Uma parte dos trabalhadores não imaginava que esse governo chegaria ao poder e, ao chegar ao poder, não achava que poderia ser tão ruim como está sendo. O governo está tentando nos sufocar e nos paralisar pela inanição. Só que os ataques à educação estão sendo tão intensos que isso acabou, ainda bem, nos levando a importantes mobilizações. O nível dos ataques é para destruir o que entendemos o que seja educação como um direito social conquistado pelos trabalhadores ao longo de suas lutas, e é justamente isso que nos impulsiona”, avaliou Eblin.

 

No início do mandato, Bolsonaro nomeou o filósofo colombiano naturalizado Ricardo Vélez Rodriguez para a Pasta da Educação por indicação de Olavo de Carvalho, ideólogo e guru do presidente. Após uma série de polêmicas, que incluíram o anúncio de uma revisão nos livros de História a respeito do que foi o golpe militar de 1964, o pedido para que as escolas gravassem os alunos cantando o Hino Nacional antes das aulas e a declaração de que os brasileiros seriam ‘canibais’ viajando, ‘roubando coisas dos hotéis’, o ministro foi substituído pelo não menos controverso Abraham Weintraub.

 

Oswaldo Teles

Oswaldo Teles

Apesar das medidas impositivas promovidas pela atual gestão federal, o descaso com a educação no país tem múltiplos atores. Prova disso são os números divulgados pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), onde o país figura no 57º lugar em leitura, na 66ª colocação em Ciências e no 70º posto em Matemática, entre 79 nações avaliadas.

 

“É importante dizer que a grande maioria dos educadores está sob a batuta dos governos estaduais e municipais. Eles são muito responsáveis pelo caminho da educação, e o Pisa refletiu que o Brasil está muito mal desse processo”, destacou Miranda.

 

Para a mudança do quadro, o dirigente do Sepe citou a necessidade de valorização dos docentes em nível nacional e destacou as alterações na legislação ocorridas nos últimos tempos como agravantes.

 

“Há um ataque constante em vários planos. Primeiro no sentido do ser docente, a reforma da Previdência precarizou muito as relações de trabalho, a falta de concursos públicos alimenta uma lógica, somada a outros aspectos, de que o ser docente para a juventude não vale tanto a pena. Isso obviamente é um quadro histórico, não podemos dizer que somente o governo Bolsonaro ou do [governador do Rio Wilson] Witzel foi responsável, mas ele introduziu o aspecto da perseguição aos docentes”, disse

 

Se a situação é ruim no setor público, não é muito diferente para os profissionais da iniciativa privada. Apesar de o Rio de Janeiro contar com aproximadamente 6% do total de instituições particulares do país, conforme dados de 2016, o panorama só favorece aos gestores das redes de ensino.

 

“O patrão, de um modo geral, nunca diz que está bom, até quando está bom. As escolas privadas cresceram em número de alunos e o professor não teve esse ganho salarial conforme o crescimento. É óbvio que nesses últimos três anos piorou muito”, afirmou Teles.

 

Eblin Farage

Eblin Farage

O aumento do número de vagas no ensino superior privado durante os governos Lula e Dilma veio acompanhado por um fortalecimento dos grupos empresariais do setor, dificultando as negociações salariais. A crise econômica que atinge o país desde 2015 piorou ainda mais a conjuntura.

 

“Há muitas escolas que não cumprem o básico da legislação, não pagam os professores em dia, não pagam os impostos, enrolam, atrasam, não cumprem o que deve ser cumprido. Essa é uma outra realidade que nós temos de enfrentar, mas nenhuma crise econômica é justificativa para um patronal não ter uma relação boa com seus trabalhadores”, alertou o presidente do Sinpro-Rio

 

Um dos mais importantes centros de resistência da educação no estado, o Colégio Pedro II sofre com o discurso de ideologização dos partidários da atual gestão do Governo Federal, mesmo que haja uma percepção diversa quanto a isso.

 

“Não vejo o Pedro II nesse contexto como uma exceção. É uma exceção da perspectiva do plano de carreira que temos, do concurso pelo qual passamos, mas o Pedro II virou o bode expiatório para a construção desse projeto de país. Se articulou um grupo de responsáveis dentro do colégio que se filiam diretamente ao ‘Escola sem partido’, que tem por objetivo perseguir professores e patrulhar ideologicamente o trabalho pedagógico feito em sala de aula”, destacou Cavalcante.

 

O dirigente comentou que os pais de alunos realizam há aproximadamente três anos uma série de denúncias em relação ao ofício dos professores: “Quatro responsáveis ligados diretamente ao ‘Escola sem partido’ foram eleitos pela comunidade para o Conselho Superior do colégio. Isso interfere demais na dinâmica porque eles se viram com um poder muito grande em relação à nossa prática cotidiana”.

 

A tentativa do governo de desmobilizar a militância oposicionista atingiu, em cheio, o movimento sindical. O Palácio do Planalto estabeleceu uma Medida Provisória que impedia a cobrança do imposto sindical no contracheque dos trabalhadores, o que levou algumas organizações à míngua.

 

“Tivemos de fazer todo um movimento para que os associados pudessem fazer o depósito direto em conta para a gente conseguir se manter, agora que conseguimos restituir o desconto em folha. Tem um patrulhamento ideológico e a tentativa de enfraquecimento das entidades e estamos em um processo de nos reerguer”, ressaltou o professor  do CPII.

 

Tiago Cavalcante

Tiago Cavalcante

Para conter o avanço do conservadorismo na educação, os profissionais apostam na união de todos os órgãos da sociedade civil desde o começo do próximo ano letivo e o reconhecimento das carreiras no ensino.

 

“O controle de conteúdos, retirar a liberdade de expressão dos professores, isso é feito em um conjunto não só com as ações do ‘Escola sem partido’, mas como, por exemplo, na tentativa de regulamentação da educação domiciliar que está em curso no Congresso Nacional. É importante que a gente entenda que a educação é atacada no seu conjunto com uma série de iniciativas. Nossa resposta para o governo não pode ser de medo, ao contrário, tem de ser ousada”, relatou a diretora do Andes.

 

“É necessário que as entidades de classe, que os trabalhadores, em especial os professores, tenham uma postura mais incisiva já no início do ano. A gente entende que não é possível iniciar mais um ano pedagógico com um contingenciamento de verbas, com falta de recursos, dando jeitinhos a partir do esforço dos trabalhadores. É necessário que a gente exija a valorização das nossas carreiras, não existe lugar nenhum do mundo que se tenha serviço público de qualidade sem valorização dos trabalhadores”, encerrou Eblin.

 

Ouça o debate na íntegra:

 

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