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Debates especiais de fim de ano: Petróleo

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É unânime a tese de que a manutenção da soberania nacional passa pela defesa de recursos naturais estratégicos, e o petróleo talvez seja o principal diferencial àqueles países que possuem a capacidade de extração e refino de suas reservas. No entanto, o Brasil joga por terra essa lógica e entrega ao capital estrangeiro não apenas nossas jazidas, como também sua estatal mais importante, uma das maiores do mundo no ramo.

 

O processo de privatização ‘fatiado’ da Petrobras e os leilões dos campos do pré-sal promovidos pelo governo Bolsonaro, mas iniciados ainda na gestão de Dilma Rousseff, põem em risco a autonomia de os brasileiros definirem os rumos das políticas de preço da energia responsável por impulsionar o crescimento da produção industrial e o dia-a-dia da população, dependente do uso de combustíveis e gás de cozinha.

 

Antony Devalle

Antony Devalle

Na série de debates especiais de fim de ano, o programa Faixa Livre convidou para debater a situação do petróleo no Brasil o diretor da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet) e da Petros Fernando Siqueira, o professor de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (INEEP) da Federação Única dos Petroleiros (FUP) Eduardo Pinto e o diretor do Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ) e membro da Federação Nacional dos Petroleiros (FNP) Antony Devalle.

 

A Petrobras entrou no foco das discussões e da cobiça internacional depois da descoberta de um esquema de corrupção, deflagrado pela operação Lava Jato, envolvendo diretores da empresa e gestores públicos. Desde então, iniciou-se uma tentativa de construção da imagem de que os desvios de recursos estariam ligados ao caráter estatal da companhia.

 

“A comunicação da Petrobras, se tivesse uma lógica pública, deveria estar combatendo toda a campanha que há contra a empresa, que utiliza o mito da Petrobras quebrada para desmontá-la, em última instância, destruí-la. Lembremos que no Jornal Nacional quase que diariamente você tinha uma imagem que acabou ficando para o público que era a de um duto enferrujado jorrando dólares. A mensagem que se passava com essa imagem, independente do texto falado, era: “tem Estado, logo é corrupto, fica ineficiente”, observou Devalle.

 

O discurso de que os crimes cometidos na administração da empresa inviabilizariam a Petrobras enquanto empresa pública foi desmontado. Nos últimos anos, o Brasil vem ampliando continuamente sua competência para exploração e produção de petróleo e derivados, atingindo um cenário próximo do atendimento pleno às demandas de consumo interno.

 

Mesmo com a crescente necessidade de insumos e os recentes dados positivos nos balanços da estatal, o Governo Federal mantém a estratégia de desmonte, negociando ativos de subsidiárias como a Liquigas e a BR Distribuidora, e deixando de investir na cadeia de refino para produção de derivados.

 

“Temos uma situação sui generis. Nos tornamos autossuficientes, aumentamos a nossa participação na exportação de petróleo cru, mas, ao mesmo tempo, cada vez mais importamos gasolina e diesel, sendo que boa parte dessas importações originária dos Estados Unidos. Você tem uma situação sui generis porque o pré-sal poderia significar uma mudança na cadeia do petróleo, com agregação de valor, geração de emprego e renda local, mas estamos nos tornando um exportador de petróleo cru sem incorporar a questão do refino”, destacou Pinto.

 

Eduardo Pinto

Eduardo Pinto

“É um ponto fundamental porque tem a ver com uma mudança de estratégia da Petrobras e dos órgãos governamentais, a forma de direcionamento do que o petróleo pode representar no desenvolvimento nacional. A atual conjuntura, tanto dos gestores da Petrobras, quanto do atual governo, adota a ideia de que o petróleo é apenas uma simples commodity e funciona com a ideia de que o petróleo não geraria grandes efeitos encadeadores para a estratégia de desenvolvimento nacional, que é um erro estratégico”, prosseguiu.

 

A defesa da venda de ativos da empresa, além da iniciativa do Palácio do Planalto, contou com o apoio da mídia dominante não apenas nos símbolos utilizados nas reportagens sobre corrupção, mas na opinião de comentaristas.

 

“A campanha para a privatização, apoiada pelo que o [Paulo Henrique] Amorim chamava de PIG, Partido da Imprensa Golpista, sempre pintou um quadro ruim da Petrobras. Tivemos o Carlos Alberto Sardenberg dizendo que o pré-sal era um marketing do governo. Depois a Miriam Leitão disse que na verdade o pré-sal existe, mas a Petrobras não tem tecnologia para isso. Aí a Petrobras pela terceira vez ganhou o Oscar da indústria do petróleo como melhor do mundo em tecnologia de águas profundas”, lembrou Siqueira.

 

A partir da administração de Aldemir Bendine, em 2014, a Petrobras passou a admitir em seus balanços contábeis, de forma inexplicável, contínuas desvalorizações de ativos. Ainda que as companhias de petróleo em todo mundo tenham seguido este processo, especialistas questionam o montante do impairment praticado pela estatal brasileira.

 

Em 2015, por exemplo, a empresa atingiu um lucro líquido de US$ 15 bilhões, mas registrou, sem maiores esclarecimentos, perdas na casa dos US$ 48 bilhões, resultando em um rombo próximo dos US$ 34 bilhões. No total de três anos, houve a criação de um prejuízo teórico de ativos de US$ 115 bilhões, segundo números do diretor da Aepet.

 

O atendimento ao método financista faz com que gestores da companhia cheguem a afirmar que a integração da empresa, com investimentos que a façam encadear todos os níveis de produção, não tem sentido econômico, indo na contramão do que cita a literatura sobre o tema e as práticas internacionais. Esta iniciativa visa reduzir os riscos inerentes à atividade, descentralizando o aporte de recursos.

 

Fernando Siqueira

Fernando Siqueira

“Boa parte da gestão está presa por uma lógica da administração financeira de curtíssimo prazo. A ideia é gerar caixa para melhorar os indicadores, dar lucros no curtíssimo prazo para melhorar as condições dos acionistas, inclusive propondo aumentar os ganhos dos acionistas minoritários”, disse o professor da UFRJ.

 

“Acho, nesse momento, difícil uma girada a despeito dos técnicos terem uma ótima formação nas suas linhas específicas, mas essa tecnicalidade ter perdido a capacidade de olhar o todo e a Petrobras, dada sua dimensão, sua capacidade de impulsionar o desenvolvimento nacional. Os técnicos olham o financeiro, perderam a noção de olhar o todo, ou seja, vivemos uma tecnocracia não só no setor público, mas nas empresas, a despeito da informação e do conhecimento ter aumentado. Por isso não entendem o papel da Petrobras, a questão nacional e as estratégias”, continuou.

 

Além da vocação para o desenvolvimento local, o petróleo se insere no contexto geopolítico, com a disputa aberta pela hegemonia global entre China e Estados Unidos. O presidente Jair Bolsonaro já deixou claro em diversas ocasiões seu alinhamento automático ao governo de Donald Trump, em um cenário onde a integração entre os países europeus e asiáticos apontam para uma mudança de rumos no protagonismo, o que deixaria o Brasil isolado.

 

Para alterar o panorama, o membro da FNP não crê no traço nacionalista apresentado historicamente pelas Forças Armadas e evoca as mobilizações populares nas ruas como alternativa à privatização.

 

“Não acredito nos militares hoje. Só o povo trabalhador se unindo em torno dessa questão e acho que é uma tarefa de todos nós. Ir aos mais diversos lugares, em cada bairro para ajudar a esclarecer e tentar trazer para o cotidiano, mostrar que o fato de o botijão de gás estar caro, por exemplo, tem a ver com a Petrobras”, citou.

 

Ouça o debate na íntegra:

 

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